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BRANECK = BERNEQUE= VERNEK = WERNECK.

BRANECK = BERNEQUE= VERNEK = WERNECK.

Data de Publicação: 27 de fevereiro de 2023 11:15:00 Momentos dos que passaram (XII)

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Os Werneck descendentes do padre Inácio de Souza Verneck, embora numerosos e espalhados por diversos locais, formaram um extensa rede de parentescos, onde nem todos se conheciam, mas no geral todos ainda sabiam com pouca conversa, como que eram os parentescos.  Um nome de um tio, de um avô, bisavô, nome de uma fazenda, eram os dados eficazes até a primeira metade do século XIX, para todos se acharem aparentados e cordiais.  Primos. E os de fora da própria parentela, também observavam e sabiam bem como eram estes laços.  Por vezes melhor sabiam do que os próprios Werneck.

Testemunho exemplar desta situação ocorreu na ocasião do falecimento e testamento da excêntrica miliardária vassourense Dona Eufrásia Teixeira Leite.

Solteirona de gênio complicado, Dona Eufázia acumulou notável fortuna investindo seus pesados capitais nas bolsas de todo mundo, em especial as dos Estados Unido e da Europa. Viveu sempre em Paris, mas vez outra aparecia em Vassouras, cuja chácara ficava entregue aos antigos empregados, muitos destes ex escravos de sua família.   

Numa temporada provisória em Vassouras, e que depois seria definitiva no Brasil, a já bem idosa Eufrásia Teixeira Leite, pretendeu beneficiar com um codicilo ao seu testamento, um primo muito amigo, da família de sua mãe, o Coronel Júlio Correia e Castro. Para tanto ela entregou a este parente, uma cópia de seu testamento feito na Europa, onde legava toda sua fortuna para uma ordem religiosa italiana, e para o Papa no Vaticano.

Dona Eufrazia  desde de jovem, andava arredia dos seus parentes paternos. As relações ainda que fossem sociais, eram sem grandes vínculos, esfriadas  desde que quando perdeu seus pais, recusou casar-se,  ela e mais uma irmã, com seus primos, por imposição de um tio, o Barão de Vassouras. Muito ricas e nada bobas, perceberam que no cerne destes casamentos estava o controle por seus futuros maridos, de suas polpudas heranças. E assim foram para Paris, para indignação dos parentes, em especial aos ligados ao Barão de Vassouras. 

O coronel Julio Correa e Castro, de posse do inusitado testamento, procurou, com o consentimento da Dona Eufrásia, um conhecido e respeitado advogado vassourense, integrante da família Werneck, o Dr. Antonio José Fernandes, neto materno do Visconde Ipiabas, e irmão do Ministro Raul Fernandes. Estes eram dois nomes de muita distinção não somente dentro da parentela, como na vida pública. Por casamento o Dr. Fernandes Júnior, era ele próprio casado com uma parenta algo próxima dos Teixeira Leite.

Percebendo o desperdício daquela fortuna ficar no estrangeiro, o Dr. Fernandes Júnior convenceu com dificuldade, a testadora mudar o testamento e beneficiar as instituições de caridade vassourenses. Lembrou-a que seu avô tinha sido um dos fundadores da falida Santa Casa de Misericórdia de Vassouras, e que a sua cidade natal carecia de escolas profissionais para os jovens de poucos recursos. Um colégio público masculino com o nome de seu pai. A ideia não foi recusada,  e foi sendo adaptada paulatinamente, as outras exigências da Dona Eufrásia, com relação a doações pias. Ela porém, mesmo que não discordando, não assinava o testamento de maneira nenhuma, numa protelação indefinida.

Finalmente no ano de 1930, no Rio de Janeiro, de partida para a Europa, ela aos 80 anos de idade, fica bastante mal de saúde, impedida de viajar. Percebendo que poderia vir a falecer no hotel dos Estrangeiros, no Flamengo, onde estava hospedada, e não desejando que como seu endereço final, na sua certidão de óbito constasse um local público, mudou-se para um moderno apartamento alugado, na ladeira Nossa Senhora da Gloria, de propriedade da Construtora Monteiro Aranha.

Junto com a milionária estavam duas de suas mucamas, e um empregado da chácara de Vassouras. Dentre as duas criadas estava a negra Cecília Bonfim, que morava por décadas, com Dona Eufrásia em Paris.

A mudança para o apartamento foi as instâncias, e também para ficar na proximidade do casal de grandes amigos, o Comandante Custódio Torres Guimarães e sua mulher Dona Edith Álvares de Azevedo Macedo.

O médico clínico particular de Dona Eufrásia, era o Dr. Egydio de Salles Guerra, de "grande nomeada", formado em mediciona na Bélgica e casado com Dona Carola Furquim Werneck. Esta era uma das afilhadas de batismo  do Dr. Joaquim José Teixeira Leite, pai de Dona Eufrásia.  O Dr. Joaquim José e o pai de Dona Carola, o Dr. Assis e Almeida viveram em São João del Rey nas suas  infâncias e mocidades, estudaram juntos na Academia de Direito de São Paulo, além de serem concunhados  e vizinhos. 

Em Vassouras, as duas chácaras do Dr. Joaquim José e do Dr. Assis e Almeida eram separadas somente por um muro, com uma abertura sem portão para que as famílias se visitassem sem necessidade de transitarem pela rua.

Com a piora da saúde de Dona Eufrásia Teixeira Leite, em seus momentos de agonia final, estavam presentes na ladeira de Nossa Senhora da Glória, o Dr. Egydio Salles Guerra e o Dr. Antonio José Fernandes Junior, este na natural expectativa que a milionária assinasse o bendito testamento. 

No quarto da moribunda, esteve também presente, na mesma expectativa, o oficial escrevente do Cartório do Quinto Oficio de Notas do Rio de Janeiro, cujo tabelião era o Dr. Fausto Werneck Furquim de Almeida, sobrinho paterno da Dona Carola Salles Guerra e portanto também primo do Dr. Antonio José Fernandes Júnior.

Na eminência que a milionária  falecesse sem assinar o testamento, na presença do escrevente, o Dr. Salles Guerra aplicou-lhe uma "injeção de óleo canforado" de maneira levantar as forças da moribunda, que assim desperta, finalmente assinou, aparentemente à contragosto, com um grande e esparramado garrancho, no livro do tabelião Werneck, o testamento que a tornou a maior benemérita da cidade de Vassouras e do Brasil até aquela data.

Testemunhou o ato, Júlio Rodrigues de Azevedo, cunhado de Dona Josefina Avellar Calvet, a primeira esposa do Ministro Raul Fernandes, e portanto ele também um das centenas de contraparentes ligados de alguma maneira à rede genealógica dos Werneck.

Pouco depois de sacramentado o testamento, Dona Eufrásia passou desta para melhor.  A parentada Teixeira Leite, que estava na sala do apartamento, na expectativa de uma grande herança, aparentemente ignorava o testamento que beneficiava o Papa, e o outro novo, que anulava o primeiro e beneficiava a cidade de Vassouras.

Quando chegou o caixão simples, para levar o corpo da defunta, uma distinta prima Teixeira Leite, também integrante da família Werneck, indignou-se que o ataúde tinha que ser de primeira qualidade, por causa da fortuna que a falecida parenta deixava.

No embarque que se seguiu na gare da Central do Brasil estavam dentre outros, muitos parentes e representantes de antigas famílias do extinto império brasileiro, e os príncipes Dom Pedro e sua mulher Dona Elisabeth, filho e nora da Princesa Isabel.

Após o enterro em Vassouras, no monumental jazigo do Barão de Itambé, e depois de conhecido o testamento, começou o zunzum entre os Teixeirea Leite. Decepcionadas e vendo quais foram os agentes participantes dos arranjos do testamento, logo alegaram as primas Teixeira Leite, capitaneadas pela Viscondessa de Taunay e pela Baronesa de São Geraldo, que o testamento havia sido "uma festa de família", (a "família" Werneck).

Reclamaram indignadas, e entraram pouco depois com uma ação de nulidade do testamento, cujo recurso para piorar, seria julgado desfavorável pelo Desembargador Salles Pinheiro, este também neto do Visconde de Ipiabas, e primo irmão do Dr. Antonico e do Dr. Raul Fernandes, primo também do Tabelião Fausto Werneck e contra parente do médico Salles Guerra.  Perceberam furiosos os Teixeira Leite, que eram Wernecks por todos os lados. 

A mucama Cecília Bonfim, que recebeu como legado no testamento, de umas apólices e uma casinha no centro de Vassouras, aliou-se as parentas Teixeira Leite de sua Sinhá. Dizia que no momento da assinatura, até por cima da cama da moribunda pularam. Em Vassouras circulou um impresso, com o seu relato da injeção do Dr. Salles Guerra, da qual ela tinha guardado a caixa vazia do medicamento.  Vociferava também a indignada mucama, que o advogado Fernandes Júnior, depois do óbito da sua Ama, mandara jogar fora o cachorrinho francês da defunta.

E nessas tentativas frustradas de anular o testamento, usaram os Teixeira Leite, as informações dos sabidos parentescos entre os Werneck,  esquecidos das antigas e cordiais camaradagens entre as famílias.  Foram os advogados Drs. Eurico Teixeira Leite, Leopoldo Teixeira Leite Filho e Astolpho Vieira de Resende os que incubiram-se das acões e processos.

Em Vassouras primos e amigos  já não se falavam. Falavam que o motivo da não anulação do testamento, era que se aquele fosse anulado, a cidade de Vassouras estaria prejudicada.  A dinheirama ia embora do Brasil. O  testamento que passaria ter validade, seria muito mais difícil de ser anulado, pois era o que beneficiava o Papa e as freiras Italianas. 

O agravo da ação de nulidade, foi publicado no Rio de Janeiro, em volumoso livro, hoje muito raro, com o título de "O Estranho Testamento de Dona Eufrásia Teixeira Leite".

O populacho vassourense, na ocasião dessa infeliz demanda, já acreditava e propagava dentre outras, a lorota que a milionária excêntrica havia feito seu herdeiro um jumento de sua chácara. Nada mais idiota, já que se ela tivesse feito qualquer menção ao tal animal como seu herdeiro, a anulação seria algo muito simples, uma impugnação por incapacidade senil e demência da testadora.

Não conseguiram os parentes Teixeira Leite qualquer bocado da fabulosa herança, que esvaiu-se mal administrada, ao longo de décadas, por mãos e bolsos indignos de sujeitos incompetentes.

O próprio Dr. Fernades Júnior, pouco tempo sobreviveu a Dona Eufrásia, e seu irmão o Dr. Raul Fernandes foi quem ocupou a inventariança do miliardário espólio, sendo inclusive quem desmanchou a elegante residência, o hotel particular de Dona Eufrasia em Paris, na Rua Bassano 40, junto ao Arco do Triunfo.

As missas anuais encomendadas  eternamente por Dona Eufrásia  em memória de seus pais e avós, na Basílica do Colégio de Salesianos de Niterói foram solenemente esquecidos pelos padres de Dom Bosco, herdeiros também de um expressivo legado da milionária vassourense.

Mesmo a Chácara da Hera, residência museu da falecida, não conserva mais hoje, quase nada do que ali existia de valor por ocasião da morte de Dona Eufrásia. Só não sumiram os grandes móveis, mas nada existe da prataria, dos pequenos objetos e até mesmo o copo com a dentura da dona Eufrasia, que a s freiras do Colegio Regina Coeli exibiam, quando eram as respondaveis pela guarda da casa museu.

Todos brigaram, e lutaram, e o dinheiro sumiu junto da dentadura. Vassouras perdeu. Sobraram somente as lembranças das desavenças geradas, e a malícia de se usar a genealogia como inconsequente  prova de formação de uma quadrilha familiar.

Por: Roberto Menezes de Moraes

 (Continua)

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